terça-feira, 13 de janeiro de 2009

30 anos de carreira, 30 anos de delírio

É sempre um número bonito, 30 anos. Neste caso, 30 anos de rock'n'roll, ou, na sua variante mais hardcore, sexo, drogas e rock 'n' roll. Não, não estou a falar dos Rolling Stones ou - para o caso dos mais incultos pensarem - dos Beatles. Sim, caso tenham pensado neles, estou mesmo a falar dos Xutos & Pontapés. Por menos gosto que lhes tenha e lhes nutra - e sei que "Não sou o único" - não consigo deixar de levantar o chapéu a uma banda que sobrevive 30 anos a viver de um sonho (viver da música), utilizando sempre os mesmos acordes, fotocopiando música atrás de música.

É de louvar que uma banda cá em Portugal - sendo banda um conjunto de elementos, individualidades como Jorge Palma, Rui Veloso ou Sérgio Godinho não contam desta vez - consiga atingir esta belíssima marca. Em 1979, quando os Xutos (vulgo nome entre o povo) se formaram, eram jovens que faziam do rock e do punk a sua voz, que procuravam expressar-se revoltosos contra tudo e todos.

Aqueles que são recorrentemente apelidados de "Rolling Stones Portugueses" - impossível perceber como, uma vez que começaram do punk e Tim pesa mais que Mick Jagger e Keith Richards juntos - atingem esta bela marca no ano que começa: 2009. Um ano que se diz de crise, mas que irá trazer, adivinho eu, mais um disco (pelo menos) de platina à banda de Tim e Zé Pedro. Sou, por vezes, o mais acérrimo defensor dos valores portugueses. Mas dos novos, não dos velhos. Porque também sou defensor, que ao fim de 15 anos, é muito complicado uma banda conseguir deitar cá para fora algo de realmente original e de valor. Mas os Xutos continuam e "O mundo ao contrário" (de 2004), não vai ficar sem sucessor. E não parece, de todo, difícil prever que o álbum não vá ser bom, original. Mas o povo português, que pouco ou nada parece ligar à cultura (neste caso musical), vai adquirir às cegas mais este registo. E se tudo correr bem ao conjunto, estaremos cá em 2018 a celebrar 40 anos - e provavelmente os Stones também vão celebrar 80 anos, mas isso é outra história.

Vejamos: nós temos excelentes valores musicais, como Clã, Peixe:Avião, Fadomorse, Legendary Tiger Man, Wraygunn, JP Simões, Manuel Cruz (que teve os lendários Ornatos Violeta e os bem sucedidos comercialmente Pluto), Guys From The Caravan, Black Bombain, ThanatoSchizO (começo aqui a entrar no metal, que é um género menos apreciado, mas igualmente rico, mas deixemos isso para outras conversas), tantos, imensos. Mas o médio ouvinte português prefere ignorar tantas boas alternativas para nomes maiores e mais fáceis, comos os Xutos. E outros produtos como os atrás mencionados e ainda Linda Martini, Mundo Cão ou Mão Morta (os senhores do norte com 20 e poucos anos musicais) parecem quase caídos no esquecimento.

Claro que tudo se resume a duas coisas: os meios de comunicação que divulgam a música e o povo. Começando pelo último, Portugal nunca foi um país do rock, de revolta, de reacção, mas antes de saudosismo, conformismo e algum facilitismo e até, mais extremamente falando, conservador. Poucos foram os punks que sobreviveram e viveram - talvez os Peste & Sida ou os Tara Perdida -, poucos são os metaleiros que ainda continuam por aí - Xeque-Mate só nos eighties e os Moonspell são, queira-se ou não, fruto de uma excelente comercialização de um produto polémico e do rock, só me lembro dos Xutos - os UHF são um caso anacrónico e algo paradoxal, os GNR bons e diferentes demais para se encaixarem neste saco, lá vão os tempos de Portugal na CEE.
Sorte, enfim, tiveram os Xutos & Pontapés em conseguirem vingar, em fazer melodias fáceis, audíveis e que agarram qualquer um. Sorte tiveram eles de os tais meios os manterem em airplay constante, numa playlist pré-definida no início de cada ano. Causa - consequência, os poucos que ouvem rádio, os poucos que compram CD's originais, conhecem bem os Xutos e mal a verdadeira categoria musical portuguesa. Que acaba, pobremente, por ser quase uma sombra dedicada a umas centenas, quase um milhar, que idolatra e vive com fervor a música, o som, as notas e as melodias.

É, no fundo, uma questão de mentalidades... E populacional. Somos um país de dez milhões, muito velho, muito idoso, com muito Alzheimer, Parkinson, gripes e artroses, com milhares de bandas/projectos a despontarem por todos o país, desejosos de viver um sonho: a música como vida.

Estão de parabéns os Xutos & Pontapés, Tim e Zé Pedro que mantêm esse sonho. Há no entanto algo que tem que se salientar: uma forte crítica ao médio português, que diz que gosta de música, mas no fundo não conhece mais que a Amália e os Xutos - pois nós portugueses só nos sentimos atingidos quando nos sentimos ofendidos. E também a todos os senhores com dinheiro para a cultura, fica aqui um recadinho: em 30 anos, Portugal tornou-se um paraíso para a vinda de grandes bandas do estrangeiro. Mas um verdadeiro pesadelo para grandes valores do panorama musical português. Porque não apostarmos num concerto de médias dimensões dos Pontos Negros, dos Linda Martini, dos Peixe:Avião, dos Fadomorse, de tantos outros? Porque não termos uma rádio - por exemplo - totalmente portuguesa, que dê a conhecer ao mundo novos valores? Porque não novos espaços para novos talentos?

Somos um país tão próprio, tão nobre e talentoso, tão fervoroso de novas ideias, tão criativo. Vamos ganhar mais prémios lá fora, vamos fazer alguém mais viver um sonho. Vamos mudar um pouco e "let's rock and roll all night", "rock around the clock".

PS - 30 anos de carreira média não é nada mau. Principalmente quando, pelo meio, se recebe do Presidente da República, a Ordem do Infante D. Henrique em 2004.

1 comentário:

Anónimo disse...

É o país que temos. Não me faz confusão os Xutos terem tanto sucesso ,há muitos saloios em Portugal que gostam de Xutos (e não me venham dizer... "Carlos, mas eu não sou Saloio e gosto de Xutos" - tretas.

Mao Morta
Mundo Cão
Ornatos Violeta

3 bons exemplos de boa música que se faz em Portugal cantada na língua de Camões.